terça-feira, 31 de janeiro de 2017

ACCAMTAS

REVISTA MINERAÇÃO E SUSTENTABILIDADE JAN/2017



A REVISTA MINERAÇÃO E SUSTENTABILIDADE, de publicação bimestral, com uma tiragem de 10 mil exemplares para todo o país, publicou como matéria de capa, no seu número 31, em janeiro de 2017, uma reportagem, da Jornalista Sara Lira, de 4 páginas sobre o estudo feito por mim "A extração ilegal de areia no Brasil".



A extração ilegal de areia no Brasil

Estudo apresenta números alarmantes da atividade ilícita, cujos lucros no país chegam a ser superiores aos dos gerados com o tráfico de drogas

Sara Lira


A extração ilegal de areia no Brasil gera lucros maiores do que o tráfico de drogas. O dado é alarmante e faz parte da conclusão de um estudo que analisou a atividade em todo o território nacional. Realizada pelo agente da Polícia Federal (PF) e especialista em direito ambiental Luís Fernando Ramadon, a pesquisa “A extração ilegal de areia no Brasil” foi divulgada em novembro de 2016 e contém análises da atividade ilícita praticada no país entre 2012 e 2015. Segundo o estudo, a receita gerada pela comercialização de areia em todo o país no ano de 2015 foi muito superior à arrecadação obtida com a Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM).

O trabalho feito pelo agente da PF mostra que o faturamento gerado pela extração de areia em 2015 foi de R$ 8,9 bilhões, 61% do que faturou o tráfico de drogas (R$ 14,5 bilhões), de acordo com o relatório “Impactos Econômicos da Legalização das Drogas no Brasil”, baseado em dados do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC). Segundo esse estudo, o faturamento proporcionado pelo tráfico da maconha chegou a R$ 4,7 bilhões; do crack, a R$ 3 bilhões; e do ecstasy, a R$ 1,3 bilhão. Isso demonstra que, isoladamente, a extração ilegal de areia ultrapassa o faturamento de todas essas substâncias ilícitas. A estimativa é que, nos quatro anos de análise, a atividade tenha gerado mais de R$ 36 bilhões de lucro.

Devido à ação clandestina, União, Estados e municípios deixaram de arrecadar em 2015, através da CFEM, entre R$ 106 milhões e R$ 142 milhões. Somando-se os valores dos quatro anos analisados, chega-se a números que ficam entre R$ 433,5 milhões e R$ 578 milhões.


De acordo com Ramadon, que também já coordenou o grupo de operações da Delegacia de Meio Ambiente do Rio de Janeiro, a pesquisa se iniciou no Rio porque ele constatou, por meio de ações policiais, que o crime se repetia constantemente e que a ilegalidade estava alta no Estado. “Mas, depois, passei a pesquisar em todo o Brasil e percebi que a coisa era mais séria e maior do que eu imaginava. O valor obtido com a venda dessa areia ilegal não gera arrecadação e acaba contribuindo para a lavagem de dinheiro, pois as lojas que compram o produto emitem notas fiscais frias”, afirma. Além dos prejuízos financeiros, a ação ilegal também promove a degradação ambiental, já que forma terrenos assoreados e extingue áreas verdes.

O estudo de Ramadon se baseou em dados do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM). Segundo o órgão federal, em 2012 foram produzidas 368.957.000 toneladas de areia; em 2013, 377.209.028 toneladas; em 2014, 391.765.746; e, em 2015, a produção foi de 348.966.176 toneladas. No entanto, a quantidade consumida não bate com a declaradamente extraída (confira tabela ao fim da matéria).


LEGISLAÇÃO

Pela Constituição da República, todo minério é considerado bem da União. Sendo assim, para se lavrar uma área, são necessárias a autorização dos órgãos competentes e as devidas licenças ambientais, além de estudos, conforme explica o advogado e especialista em direito minerário Bruno
Feigelson. “Qualquer extração que não respeita esses trâmites é irregular e se enquadra no artigo 55 na Lei dos Crimes Ambientais (9.605/1998). A pena é detenção de seis meses a um ano, mais multa”, diz.

A atividade também é tipificada como crime por ataque ao patrimônio, balizado pela Lei nº 8.176, de 8/2/1991, que, no artigo 2º, prevê crime na modalidade de usurpação a produção de bens ou a exploração de matéria-prima pertencente à União sem autorização legal ou em desacordo com o título autorizativo. A lei também pune quem adquirir esse material, bem como quem o transportar, industrializar, consumir ou comercializar. “Os agregados, muitas vezes, não chamam a atenção. No Brasil. Considera-se muito o minério de ferro, e o agregado, por ser um minério de valor mais baixo, recebe atenção menor por parte do Estado”, destaca Feigelson.

Ainda assim, há quem não se intimide e se aposse de determinada área para extrair o material, cometendo não somente a ilegalidade de lavrar sem autorização, mas ainda a de degradar a área. Para isso, de acordo com Ramadon, pessoas comumente se utilizam de milícias para expulsar os moradores e proteger o “negócio”. Há casos também em que o minerador possui a outorga legal, mas, depois, passa a extrair fora da área autorizada. “Como crime organizado, a infiltração no poder público é uma realidade. Em troca de vantagens ou de participação no “esquema”, agentes públicos impulsionam os processos administrativos de permissão ou autorização, bem como a expedição de guias, além de postergar ou não realizar a fiscalização. Em alguns casos, essas pessoas até mesmo fazem a inserção de dados falsos nos sistemas”, denuncia o autor do estudo.


REPRIMINDO O CRIME

A informalidade e a falta de fiscalização de pequenas mineradoras colaboram para a incidência do crime. O órgão responsável por esse trabalho é o DNPM. No entanto, conforme relata Ramadon, dada a “conhecida falta de estrutura” do departamento nacional, o trabalho não é executado de forma adequada. A reportagem entrou em contato com a assessoria de imprensa do órgão, que não retornou. “O DNPM conta com um time de profissionais excelente. Mas é uma autarquia que não dispõe de recursos há muito tempo”, lamenta Feigelson. “O DNPM fiscaliza principalmente a lavra legal. No entanto, a Polícia Federal demanda ações mais duras, que visem à prisão em flagrante de pessoas envolvidas na atividade de extração ilegal de areia”, completa Ramadon.

Como Luís Fernando explica no estudo, em 2015 o Ministério Público Federal (MPF) instaurou 223 Inquéritos Civis Públicos em função de supostas irregularidades cometidas por empresas de mineração e pessoas físicas, que causaram danos ao meio ambiente ou ao patrimônio público em decorrência da atividade de mineração. “Esse indicador nos permite perceber a gravidade da questão e o trabalho que precisa ser realizado para se tentarem punir os culpados pelos crimes”, salienta.

De acordo com o estudo do policial, Estados das regiões Norte e Nordeste são os que apresentam o maior índice de constatação de extração ilegal de areia no Brasil, seguido pelos da região Centro-Oeste. Depois, vêm os do Sudeste e do Sul, os quais apresentam números menores de ocorrências de extração ilegal de areia.

Na opinião do especialista, para que o crime seja coibido, é necessário que haja a integração do trabalho das instituições, que, juntas, podem conseguir apoio do DNPM e de institutos ambientais. “Combater a extração ilegal de areia é mais fácil do que o tráfico de drogas. Se a pessoa tiver a oportunidade de legalizar sua área para fazer a extração, melhor. Não é abrir facilidades, mas criar oportunidades. Eu desejo que haja repressão efetiva para localizar esses grandes destruidores da natureza”, frisa.


A IMPORTÂNCIA DOS AGREGADOS

A areia, o cascalho, o saibro e outros materiais compõem um importante grupo: o de agregados para a construção civil. São matérias-primas indispensáveis para o desenvolvimento da infraestrutura urbana e de moradia.

De acordo com o agente da Polícia Federal e autor do estudo sobre a extração ilegal de areia no Brasil, para cada quilômetro de uma linha do metrô, por exemplo, são consumidas 50 mil toneladas de agregados, e a mesma distância de uma estrada pavimentada consome 9.800 toneladas. Em edifícios, são utilizadas 1.360 toneladas em cada mil metros quadrados de área construída. Em casas populares de 50 metros quadrados, são usadas 68 toneladas. Além disso, Ramadon lembra que a areia é constantemente empregada na indústria de transformação: vidros, química, cerâmica, siderurgia, filtros, sendo esses setores que usam a areia em alguma parte do processo.

A areia é encontrada em leitos de rios, dunas e planícies, podendo ser classificada como fina, média ou grossa. Para se extraírem os depósitos nos rios, são utilizadas dragas de sucção, que bombeiam a água, separando a areia em lagoas de decantação. A partir daí, ela é retirada por pás carregadeiras ou de forma braçal. Nas planícies, a extração nas cavas ocorre em depósitos aluvionares, por meio de escavação mecânica ou de desmonte hidráulico.


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