ACCAMTAS

A EXTRAÇÃO ILEGAL DE AREIA NO BRASIL E NO MUNDO




"A extração ilegal de areia está se tornando um dos crimes mais lucrativos e mais danosos ao meio ambiente. Ele é cometido diariamente no Brasil em todo e no Mundo, e seu faturamento anual é muito alto, sendo estimado no Brasil, por este estudo, entre R$ 7.664.977.005,00 e R$ 8.078.414.680,00.

No mundo ele foi estimado entre US$ 181,96 bilhões e US$ 215,14 bilhões, sendo o terceiro maior em faturamento no ranking dos principais crimes globais, ficando atrás somente da Pirataria e Falsificações, que tem um faturamento entre US$ 923 bilhões e US$ 1,130 bilhões e do Tráfico de Drogas, com um faturamento entre US$ 426,0 bilhões a US$ 652,0 bilhões."


O estudo “A EXTRAÇÃO ILEGAL DE AREIA NO BRASIL E NO MUNDO”, agora em 2018, encerra a trilogia iniciada com a “CONTABILIDADE DO EXTRAÇÃO MINERAL ILEGAL NO RIO DE JANEIRO”, em 2015 e “A EXTRAÇÃO ILEGAL DE AREIA NO BRASIL”, em 2016.

Eles não seriam possíveis sem o apoio institucional, técnico e acadêmico da Polícia Federal, através dos cursos realizados na Divisão de Combate aos Crimes de Meio de Ambiente e Patrimônio Histórico (DMAPH), representados pelos Delegados Adalton Martins, Renato Maudsen e Franco Perazzoni.

Também não seria possível sem o apoio do Grupo de Perícia em Meio Ambiente, do Núcleo de Criminalística (NUCRIM), representado pelo Perito Geólogo Flávio da Rocha e da Delegacia de Combate aos Crimes de Meio de Ambiente e Patrimônio Histórico (DELEMAPH/RJ), representado pelo Agente André Muniz e pelos Delegados Anderson Bichara, Agostinho Cascardo e Marcos Aurélio Lima, com os quais tive a oportunidade e a satisfação de trabalhar pessoalmente.

Aproveito para agradecer o apoio e incentivo do Professor e Advogado Bruno Feigelson e do Professor Pedro Avzaradel, assim como das oportunidades acadêmicas que tive junto ao Instituto Brasileiro de Direito Minerário, através dos professores e advogados William Freire, Tiago Mattos, Marcelo Azevedo e Paulo Honório de Castro Junior.


Agradeço ainda, à minha esposa e aos meus filhos, pelo tempo que deixei de ficar com eles para realizar este estudo, assim como aos meus atuais chefes, delegados Paulo Teles e Simone Leite, por todo o apoio e incentivo recebido.


Este estudo é aberto a todo público e direcionado principalmente a todas as Delegacias de Meio Ambiente (DELEMAPH) e as de Combate ao Crime Organizado (DELECOR) da Polícia Federal, para tomarem conhecimento da proporção dos danos ambientais e financeiros, que esse crime da extração ilegal de areia, e de minerais em geral, provocam no nosso país e no restante do mundo.  




RESUMO 

Estamos vivenciando tempos difíceis em todas as áreas do planeta, com os recursos naturais sendo consumidos implacavelmente. Temos problemas de toda a ordem e o mais recente soma-se à explosão demográfica, já apontada na Conferência de Estocolmo em 1972, como um problema a ser resolvido.

Em 2014, o Programa da Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), alertou sobre o problema da futura escassez de areia, um dos recursos naturais mais acessíveis, em função demanda insaciável para a construção de moradias e obras públicas, como estradas e rodovias, extraída principalmente em rios, praias, restingas e depósitos arenosos, causando danos ambientais irreversíveis nos ecossistemas.

Com esse alerta, diversos estudos começaram a ser produzidos para dimensionar o problema e procurar soluções alternativas para a areia, como um dos agregados do concreto, alicerce da construção civil em suas obras.

Além de ser um grande problema, um outro sorrateiramente vem acompanhando esse tema, que é a extração ilegal de areia por criminosos comuns, crime organizado, milícias, máfias, guerrilheiros, agentes públicos e por empresários do setor em todo o mundo.

Eles viram nesse recurso natural “abundante”, uma forma de enriquecimento fácil com muito menos risco e custos que outros crimes globais, como o tráfico de drogas, de seres humanos, de órgãos ou de animais silvestres.

A extração ilegal de areia está se tornando um dos crimes mais lucrativos e mais danosos ao meio ambiente. Ele é cometido diariamente no Brasil e em todo o mundo, e seu faturamento anual é muito alto, sendo estimado no Brasil, por este estudo, entre R$ 7.6 bilhões e R$ 8,1 bilhões.

No mundo ele foi estimado entre US$ 181,96 bilhões e US$ 215,14 bilhões, sendo o terceiro maior em faturamento no ranking dos principais crimes globais, ficando atrás somente da Pirataria e Falsificações, que tem um faturamento entre US$ 923 bilhões e US$ 1,130 bilhões e do Tráfico de Drogas, com um faturamento entre US$ 426,0 bilhões a US$ 652,0 bilhões.

São valores muito significativos que não podem ser desprezados e devem ser encarados com as sérias e pertinentes preocupações por quem tem a responsabilidade de combatê-lo. Agregando-se o fator escassez, temos uma situação realmente preocupante para as nações em desenvolvimento, as mais necessitadas de obras de infraestrutura e maiores consumidores dos recursos naturais estudados.

A China, a Índia, o Brasil, os países asiáticos e o continente Africano estão no topo de uma lista de maiores consumidores de areia ilegal, onde o combate acontece, na maioria das vezes de forma tímida e encabulada, com as autoridades não investindo recursos para minimizar os crimes nos areais e nem para divulgar os impactos ambientais.

Além disso, este estudo também trata de como funciona o setor mineral no Brasil, quais os crimes ambientais cometidos nessa área, os regimes de exploração legal, o Modus Operandi dos criminosos e alguns exemplos de países onde ocorrem a extração ilegal de areia.


Ranking Atualizado dos Principais Crimes Globais – GFI/LFR

CRIMES
2017[1]
US$ bilhões
1
PIRATARIA E FALSIFICAÇÕES
923,0 a 1.130,0
2
TRÁFICO DE DROGAS
426,0 a 652,0
3
EXTRAÇÃO ILEGAL DE AREIA
181,96 e 215,14
4
TRÁFICO DE PESSOAS
150,2
5
EXTRAÇÃO ILEGAL DE MADEIRA
52,0 a 157,0
6
MINERAÇÃO ILEGAL DE OURO, DIAMANTES E PEDRAS PRECIOSAS
12,0 a 48,0
7
PESCA ILEGAL
15,5 a 36,4
8
TRÁFICO DE ANIMAIS SILVESTRES (SELVAGENS)
5,0 a 23,0
9
ROUBO DE PETRÓLEO BRUTO
5,2 a 11,9
10
TRÁFICO DE BENS CULTURAIS E ARTÍSTICOS
1,2 a 1,7
11
TRÁFICO DE ARMAS
1,7 a 3,5
12
TRÁFICO DE ÓRGÃOS
0,84 a 1,7
Fonte: Global Financial Integrity – GFI/Ramadon, Luis Fernando
           



INTRODUÇÃO

 O mundo não vive e nem progride sem a mineração. Ela é considerada de utilidade pública[2] e de interesse social[3], ao fornecer a matéria-prima para uma quantidade muito grande de produtos necessários ao ser humano.

Por outro lado, por se tratar da extração de recursos naturais não renováveis, é uma atividade altamente impactante e não sustentável. São muitos os efeitos ambientais e socioeconômicos do aproveitamento das jazidas minerais, havendo um esforço atual do setor mineral, para que a atividade seja planejada e executada observando os princípios básicos do desenvolvimento sustentável.

A importância do meio ambiente em relação à extração mineral encontra-se no Art. 225 da CF/88: “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”. Já, o parágrafo 2º determina que aquele que explorar os recursos minerais, fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei.

No Capítulo 1, abordamos os aspectos gerais da mineração, os regimes de exploração e aproveitamento de recursos minerais, os possíveis processos minerários, os impactos ambientais provocados pela extração mineral e também a Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM) e a Taxa Anual por Hectare (TAH).

O Capítulo 2 versa sobre os crimes ambientais na mineração, previsto na Constituição Federal de 1988, que os recursos minerais são bens da União, inclusive os do subsolo. (Art. 20, IX, CF/88), competindo-lhe privativamente legislar sobre as jazidas, minas, outros recursos minerais e metalurgia (Art. 22, XII, CF/88).

O Art. 55 da lei 9605/1998, Lei dos Crimes Ambientais, com objetivo explícito de proteção ao meio ambiente, considera crime "executar pesquisa, lavra ou extração de recursos minerais sem a competente autorização, permissão, concessão ou licença, ou em desacordo com a obtida".

O Art. 2º da Lei 8.176, de 08 de fevereiro de 1991, destinado à proteção do patrimônio da União prevê que “constitui crime, na modalidade de usurpação, produzir bens ou explorar matéria-prima pertencentes à União, sem autorização legal ou em desacordo com o título autorizativo”.

Temos ciência que a extração mineral se torna muito mais impactante e degradante quando ocorre de forma ilegal ou informal, pois não existe nenhum tipo de controle ou fiscalização. No Brasil, um dos crimes mais comuns nessa atividade é a extração ilegal de areia, um dos mais importantes agregados da construção civil.

Desta forma, no Capítulo 3 o objetivo principal foi criar uma estimativa sobre o faturamento da extração ilegal de areia no Brasil, utilizando como base da pesquisa o consumo aparente de cimento.

A análise também mensurou outros parâmetros, divididos em socioeconômicos, que se referem aos Inquéritos Civis Públicos abertos pelo Ministério Público Federal; ao Produto Interno Bruto – PIB e PIB per capita; e à população e os parâmetros minerários se referem à produção e à comercialização; à quantidade de outorgas de Licenciamento, de Concessão de Lavra e demais Processos Minerários; e ao recolhimento da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais – CFEM.

As estimativas foram calcadas em dados pesquisados em diversas fontes abertas, como a Agência Nacional de Mineração (ANM); o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE; a Associação Nacional das Entidades de Produtores de Agregados para Construção Civil (ANEPAC); o Sindicato Nacional da Indústria de Cimento (SNIC), entre outras.

No Capítulo 4 o objetivo foi global ao se criar uma estimativa sobre o faturamento da extração ilegal de areia no mundo, através de análises das estimativas baseadas no consumo aparente de cimento, resultando numa produção estimada de areia e pela utilização do nível de ilegalidade e legalidade dessa produção, além da sua comparação a outros crimes transnacionais, como a Pirataria e Falsificações, Tráfico de Drogas entre outros.

Os dados nesse capítulo, que resultaram nas estimativas, foram pesquisados em diversas fontes internacionais, como o Programa das Nações Unidas para o Ambiente (PNUMA ou United Nations Environment Programme - UNEP), o Serviço de Alerta Ambiental Global do PNUMA (GEAS) e o U.S.G. Mineral Commodity Sumaries.

Os dados comparativos foram pesquisados no Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crimes (UNODC), no Global Drug Survey (GDS), no “Relatório da UNEP-INTERPOL: “Rise of Environmental Crime - Aumento do Crime Ambiental”, na “World Customs Organization” - Organização Mundial de Aduanas (OMA) e na “Global Financial Integrity” (GFI).

E por último, no Capítulo 5, “Ícones da Extração Mineral”, foram relacionados diversos países, onde ocorrem a extração ilegal de areia e os países consumidores da areia ilegal, através de reportagens publicadas pelos principais jornais e mídias mundiais, além de outras informações pertinentes às questões minerárias da areia.

As informações e dados sobre os países que aparecem neste estudo, foram obtidas através de fontes abertas e jornalísticas como o New York Times, The Wall Street Journal, European Journal of Criminology, The Guardian, The Financial Times, The Times of Índia, Coastal Care, Centro ENVIS sobre Problemas Ambientais da Mineração, Indian Institute of Technology (ISM), Daily News Analysis, National Industrial Sand Association (NISA), The InduInternational Journal of Comparative and Applied Criminal Justice Conversation Global, Finance & Development, Fundo Monetário Internacional (FMI) Les Echos, Journal Science, Associação Americana para o Avanço da Ciência (AAAS) entre outras.


APRESENTAÇÃO

Tive a oportunidade de trabalhar com o autor, Luis Fernando Ramadon, quando este chefiava o Núcleo de Operações da Delegacia de Repressão a Crimes Contra o Meio Ambiente e Patrimônio Histórico (DELEMAPH/RJ), em missões de combate a extração mineral ilegal de areia na emblemática área de Seropédica/RJ. É um profissional com grande experiência na área de investigação e inteligência policial, tendo se debruçado, com afinco sobre o tema da extração mineral irregular de areia.

O livro “A EXTRAÇÃO ILEGAL DE AREIA NO BRASIL E NO MUNDO” é uma iniciativa, senão inédita, de relevância impar para o setor mineral e de defesa do meio ambiente. A investigação, e elucidação, dos crimes de usurpação de bens da União (Lei n 8176/91) e dos crimes ambientais (Lei n 9605/98) cometidos no desenvolvimento irregular dessa atividade, sangram os cofres públicos, assim como comprometem irremediavelmente o equilíbrio ambiental das regiões afetadas.

A presente obra é desafiadora, tendo em vista que contabilizar os recursos envolvidos nessa atividade ilegal é de grande complexidade, pois não existem dados oficiais sobre o assunto. O autor o fez baseado em extensas pesquisas em fontes públicas, com o discernimento que sua formação jurídica e a extensa experiência em inteligência policial o permitiram. Outro aspecto importante é que a areia, bem mineral que se encontra na base da indústria da construção civil, sofre influência direta dos ciclos de crescimento econômico e, portanto, a ilegalidade impõe altos prejuízos aos empresários formais e ao país.  

Nesta nova abordagem, incluindo a atividade de extração mineral ilegal de areia em outros países do mundo, o autor delineia a importância em termos econômicos e ambientais das necessárias ações de combate a este tipo de crime por parte do poder público.

Não obstante o aparato estatal existente no Brasil para a regulação da atividade de extração mineral, cabe aqui destacar o alto nível de informalidade (ilegalidade) que, ainda, impera nessa área. Os responsáveis por essas irregularidades se valem, em grande parte, do desmantelamento, bem como da desarticulação de atuação dos órgãos públicos responsáveis por regular e fiscalizar o setor.

Fazemos votos de que a recém-criada Agência Nacional de Mineração (ANM), reivindicação de mais de 20 anos dos funcionários de carreira do extinto Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), venha trazer ordem a este que é um setor fundamental para o desenvolvimento econômico do Brasil.

Nesse sentido, a presente obra é de grande importância, uma vez que demonstra que somente com o desenvolvimento formal, atendendo aos requisitos legais minerários e ambientais, a atividade pode trazer crescimento econômico equilibrado. Os dados coligidos pelo autor dão conta do vultuoso fluxo financeiro obscuro das organizações criminosas e, consequentemente, de como o investimento público no combate a ilegalidade, feito de maneira planejada, pode trazer resultados positivos para a sociedade.

No livro, é traçado um cenário de como grandes obras de engenharia, ocorridas mundo afora, podem interferir substancialmente no equilíbrio de regiões e a quantidade de recursos financeiros desviados.
Sua leitura é recomendada a todos que tem interesse em conhecer a forma de atuação dos grupos criminosos que atuam na extração ilegal de areia. Parabenizo o autor pela iniciativa de destrinchar o assunto, alertando aos responsáveis em combate-lo sobre a importância que o tema se reveste.  

Rio de Janeiro, 1º de janeiro de 2018

Flávio França Nunes da Rocha
Perito Criminal Federal, componente do Grupo de Perícias em Meio Ambiente – GPMA.
 Bacharel em Geologia (1987) pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ;
Mestre em Geociências (1997) e Doutor em Ciências (2003) pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS.




Luis Fernando Ramadon é Bacharel em Direito e Economia, Pós-graduado em Direito Ambiental, com especialização em Direito Minerário e Agente de Polícia Federal.

Contato por e-mail:  LFRAMADON@UOL.COM.BR











[1] http://www.gfintegrity.org/report/transnational-crime-and-the-developing
[2] De acordo com o Decreto-Lei 3365, 21/06/1941, que dispões sobre desapropriações por utilidade pública, em seu artigo 5º alínea f: “ Consideram-se casos de utilidade pública: o aproveitamento industrial das minas e das jazidas minerais, das águas e da energia hidráulica”. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del3365.htm. Acessado em 01/10/2016.
[3] De acordo com a Resolução Conama 369/2006, Art. 2o , II, d. - O órgão ambiental competente somente poderá autorizar a intervenção ou supressão de vegetação em APP, devidamente caracterizada e motivada mediante procedimento administrativo autônomo e prévio, e atendidos os requisitos previstos nesta resolução e noutras normas federais, estaduais e municipais aplicáveis, bem como no Plano Diretor, Zoneamento Ecológico-Econômico e Plano de Manejo das Unidades de Conservação, se existentes, nos seguintes casos: II - interesse social: d) as atividades de pesquisa e extração de areia, argila, saibro e cascalho, outorgadas pela autoridade competente.